domingo, 16 de janeiro de 2011

Pena de Anjo3 by Valentinab


CAPÍTULO 3
By Valentinab




[ TRÊS ANOS DEPOIS]

Depois que dei meu depoimento à polícia e fiz o retrato falado do suposto agressor, saí daquele lugar querendo esquecer o que vi.

Não descobri quem era a garota, pois não havia nada no local que pudesse identificá-la.
Fui embora e nunca mais soube quem era ela, mas jamais me esqueci de seu apelo dramático pela morte. Nunca vi alguém com tanta vontade de morrer quanto ela.

A partir daquela noite os rumos da minha vida mudaram completamente.
Agora, três anos depois, as lembranças daquele galpão, mesmo não querendo, ainda me acompanhavam.

Eu já tinha me deparado com situações tão horríveis e até piores que aquela.
Meu trabalho como paramédico ocupava grande parte do meu dia, mas me realizava completamente. Tinha descoberto minha verdadeira vocação.

Em todos os meus atendimentos e mesmo enquanto andava pelas ruas, em minhas folgas, procurava sempre entre a multidão o rosto daquela menina, na esperança de encontrá-la recuperada e feliz. Não sei por que, mas isso virou quase que uma obsessão. Tentei junto à polícia saber quem era ela, mas por se tratar de menor, os dados eram sigilosos e não consegui nenhuma informação.

Hoje era minha folga e aproveitei para visitar meu sobrinho que tinha acabado de nascer. Emmet e Rosalie, sua esposa, estavam deslumbrados com o pequeno Ethan. Realmente era um bebê adorável e pegá-lo no colo me fez reconhecer que aquele também era um sonho meu, ser pai e ter minha própria família. Faltava apenas encontrar a mulher que eu tanto esperava que aparecesse na minha vida, mas que ainda não tinha encontrado.

Saí do hospital feliz por ter compartilhado aquele momento de felicidade com meu irmão e sua esposa. Ethan era o primeiro parente biológico de Emmet e isso havia mexido muito com ele. Sua alegria era contagiante.

Uma das ruas que sempre trafegava para chegar até meu apartamento estava fechada por causa de um cano que havia estourado, por isso tive de pegar um desvio. Foi quando vi a ambulância da minha equipe estacionada na frente de uma casa. Normalmente eu seguiria em frente, pois não era meu turno, mas sem saber por que, estacionei meu carro e fui perguntar a Ramon, o motorista, o que tinha acontecido.

- Tentativa de suicídio, cara. A garota cortou os dois pulsos. Peter disse que dá pena de ver.
Tentativa de suicídio era um dos atendimentos que mais mexia comigo.
Sem uma razão que justificasse meu comportamento, entrei na casa e subi as escadas, seguindo o barulho.

Peter e Bart estavam no banheiro, agachados ao lado da menina. A mãe gritava de desespero.
Bart olhou pra mim, estranhando o fato de eu estar ali, sem uniforme, e balançou a cabeça.

- Ela se foi, não há mais nada que possamos fazer.

Olhei pra baixo e não acreditei no que vi. Numa situação macabra de Déjà vu, lá estava a garota do galpão, mais uma vez deitada sobre uma poça de sangue, com os pulsos envoltos com faixas. A quantidade de sangue indicava a profundidade dos cortes, demonstrando sua convicção na vontade de se matar.

Ela tinha enfim encontrado a morte que tanto desejou naquele dia. Mas por que isso não me deixava aliviado? Muito pelo contrário...

Numa atitude de desespero, impulsionado por uma força desconhecida, ajoelhei no chão, sem me importar com o sangue que me encharcavam as calças, e comecei a fazer massagem cardíaca nela. Eu tinha de trazê-la de volta. Ela não ia morrer na minha frente.

- Ficou louco, Edward, ela está morta!

Peter estava estarrecido com minha postura.

Naquele momento havia apenas eu e ela no banheiro.

Apertava compulsivamente seu peito, sobre o coração, como se ressuscitá-la fosse a minha razão de existir. Levei minha boca a sua e pude sentir seus lábios gelados e sem vida tocar os meus. Soprei o ar dos meus pulmões em sua boca e pela segunda vez roguei a Deus em pensamento, só que desta vez foi para que ela vivesse.

- VOCÊ TEM DE VOLTAR, NÃO PODE MORRER!

Voltei minhas mãos novamente sobre seu coração e continuei a massagear. Dava pra ver as cicatrizes deixadas pelo estuprador, pois tinham rasgado-lhe a camiseta para facilitar o salvamento. Percebia que meus colegas falavam comigo, mas eu não os ouvia. Eu apenas estava concentrado em trazer a vida de volta àquela garota.

- ELA VOLTOU A RESPIRAR!!

O grito de Peter me tirou do transe. Mais que depressa ela foi colocada em uma maca e uma máscara de oxigênio tampou sua boca. Estava viva.

Caí sentado no chão sem forças pra falar. Não entendia o que tinha acabado de acontecer. O destino tinha me colocado novamente no caminho dela e eu não sabia por que.

Informaram-me depois que se chamava Isabella, que tinha dezesseis anos e que não tinha ficado com seqüelas da parada cardíaca.

Quando saiu da UTI não tive coragem de visitá-la. Estava em depressão profunda e encontrar a pessoa que tinha lhe devolvido aquilo que ela tinha se esforçado tanto para perder – “a vida” – não seria nada agradável para ela.

Um tempo depois fui até sua casa. Talvez agora fosse a hora de conhecê-la, mas soube pelos vizinhos que sua família tinha ficado muito abalada e que se mudaram sem dizer para onde, tentando fugir da tragédia que acompanharia a filha para sempre. Pelo visto os vizinhos não sabiam que esta não era a primeira na vida de Isabella.

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